O resumo da interpretação pacífica dos Tribunais tem dado origem às súmulas que regram decisões semelhantes no Poder Judiciário Brasileiro, dando, inclusive, base à súmula vinculante inserida no atual Código de Processo Civil a partir de sua entrada em vigor em 2015.

É o fortalecimento do direito jurisprudencial, expressão utilizada no pela Prof. Teresa Arruda Alvim, para decidir diversas questões submetidas à análise dos Tribunais brasileiros.

A súmula teve o seu nascimento a partir dos anos sessenta e se consolidou com a Emenda Constitucional 45 que autorizou a edição das súmulas vinculantes que surgem a partir de decisões semelhantes e após um procedimento específico passam a ser aplicadas para todos nos casos similares.

A par das súmulas vinculantes, existem as súmulas comuns que têm o objetivo de guiar as decisões dos Tribunais em casos idênticos, mas não têm o poder normativo que aquelas possuem.

O Código de Processo Civil prevê em seu artigo 926 que os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. Além disso, importante ressaltar que no dispositivo seguinte, em seu parágrafo primeiro, está prevista a observação, pelos juízes, de duas regras, sendo uma a de possibilitar a manifestação das partes quando decidirem sobre algum precedente e a outra sobre a fundamentação por parte do julgador acerca da aplicação do precedente. Ou seja, entende-se que não basta citar a súmula ou o seu texto, é necessário demonstrar que a decisão se adequa aos fundamentos constantes do enunciado da súmula utilizada como paradigma.

Nem sempre é o que ocorre. Um exemplo típico disso são as decisões proferidas com base na súmula 492 do Supremo Tribunal Federal que enuncia: “A empresa locadora de veículos responde, civil e solidariamente com o locatário, pelos danos por este causados a terceiro, no uso do carro locado”. Em regra, os Magistrados citam o enunciado sem se aterem aos motivos pelos quais a súmula foi editada.

O acórdão do Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário 60.477/1966), do Relator Ministro Vilas Boas, que serviu de base para a súmula, deu enfoque à solidariedade entre a locadora e o locatário do veículo, todavia foi bastante enfático ao mencionar que o motivo de se chegar à conclusão de que havia solidariedade devia-se ao fato de que a locadora não teria se acautelado para entregar o veículo a uma pessoa que não estava devidamente habilitada para trafegar em via pública, de acordo com o Código de Trânsito.

A importância de se mencionar os fatos quer naquele caso quer em quaisquer outros que tenham por base a súmula é que a solidariedade não se presume, pois ela decorre da lei ou da vontade das partes, conforme disposto no Código Civil, caso contrário haveria de se entender por uma responsabilidade extensa e em cadeia, o que não seria cabível por ser a responsabilidade, no caso, pessoal.

O fato é que as decisões subsequentes e, principalmente, as mais atuais têm se limitado a aplicar a súmula nos casos envolvendo locadoras de veículos, sem adentrar aos fatos específicos do caso submetido ao Poder Judiciário.

Em suma, não são analisados os detalhes do caso, aplicando-se, indiscriminadamente, a súmula como se a solidariedade estivesse implícita na atividade de locação de veículos.

Assim, observa-se a importância de o julgador analisar o caso que lhe é submetido sob o prisma da súmula a ser aplicada a fim de fundamentar e justificar ou não a sua incidência. E, sem que se trace uma adequação entre o precedente e o caso concreto, com a simples citação do texto constante do enunciado, há uma grande possibilidade de se cometer uma injustiça e, mais do que isso, extirpar o direito de uma das partes no processo.

Daí a importância de os julgadores fundamentarem as suas decisões de forma clara a fim de que se constate a similaridade com o precedente, mormente porque existem vários julgados, convertidos em súmulas, que, embora utilizados como precedentes, não refletem exatamente os fatos e o direito que se busca obter em juízo.

E. Ideli Silva é Graduada pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, especializada em Direito Privado, Direito Processual Civil e Direito de Família.