Em decorrência da disseminação do Covid-19, em 20/03/2020 foi reconhecido estado de calamidade pública pelo Decreto Legislativo nº. 6, sendo publicada em 22/03/2020 a Medida Provisória nº 927, com o fim de flexibilizar regras trabalhistas para enfrentamento da pandemia.

Diante da falta de consenso, o Senado retirou a MP da pauta de votação, que teve o prazo de vigência expirado em 19/07/2020.

Com a perda da eficácia da MP 927 em 19/07/2020, nos termos do § 3º e § 11 do artigo 62 da Constituição Federal, o Congresso Nacional deveria editar um Decreto Legislativo para disciplinar a relações jurídicas decorrentes da Medida Provisória, no prazo de 60 (sessenta dias).

No entanto, passados os 60 dias, como usualmente ocorre, o Congresso Nacional não editou o Decreto Legislativo, o que faz incidir o disposto no §11 do artigo 62 da Constituição Federal, o qual estabelece que “as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas”.

Desta maneira, entendemos que continuam válidos todos os acordos celebrados durante a vigência da Medida Provisória 927/2020, ou seja, de 22/03/2020 a 19/07/2020, respeitados os limites do término do estado de calamidade pública, ou seja, até 31/12/2020, como previsto na própria Medida Provisória.

No entanto, novos acordos deverão observar as disposições contidas na CLT.

Fazemos a seguir um breve descritivo dos principais pontos da Medida Provisória.

Férias:

A medida previa a possibilidade de (i) antecipação de férias com períodos aquisitivos incompletos; (ii) o pagamento do terço constitucional até dia 20/12/2020; (iii) o pagamento das férias no 5° dia útil do mês subsequente ao início do gozo; (iv) comunicação de concessão de férias com 48hs de antecedência; e (v) flexibilização de formalidades para a concessão de férias coletivas, com comunicação com antecedência de 48 horas, sem necessidade de observância dos limites mínimos de dias previstos na CLT e do limite máximo de períodos anuais, e sem a obrigatoriedade de comunicação aos órgãos do Ministério da Economia e Sindicato.

A partir de 20/07/2020, (i) a comunicação ao empregado deve se dar com antecedência de 30 dias; (ii) não há possibilidade de antecipação das férias com períodos aquisitivos incompletos; (iii) o pagamento das férias, incluindo o respectivo terço constitucional, deve ser efetuado de forma antecipada, no máximo até 2 dias antes do início do gozo das férias; e (iv) a concessão de férias coletivas necessita da observância das formalidades previstas na CLT.

Feriados:

Na vigência da medida provisória, os feriados civis poderiam ser antecipados unilateralmente pelo empregador e os religiosos com anuência do empregado, o que fica vedado com a perda da eficácia da MP.

Todavia, se foram antecipados feriados por ocasião da vigência da medida provisória, o empregado poderá trabalhar normalmente no dia do feriado antecipado cuja folga foi usufruída anteriormente, e não fará jus à percepção em dobro da remuneração em referido dia.

Banco de Horas:

A MP 927 previa a compensação do banco de horas em até 18 meses contados do encerramento do estado de calamidade pública, ou seja, a partir de 01/01/2021 contaria o prazo de 18 (dezoito) meses para a compensação das horas negativas realizadas durante a vigência da Medida Provisória.

No nosso entendimento, permanecem válidos os acordos firmados durante a vigência da medida provisória, de modo que as horas negativas realizadas no período de 22/03/2020 a 19/07/2020 podem ser compensadas com horas positivas até junho de 2022.

No entanto, as horas negativas realizadas a partir de 20/07/2020 devem ser submetidas ao regime de banco de horas normal previsto na CLT, ou seja, 6 meses em caso de acordo individual ou 12 meses em caso de acordo coletivo ou convenção coletiva.

Teletrabalho:

Aqueles que formalizaram o regime de teletrabalho por ocasião da vigência da Medida Provisória, podem dar continuidade à prestação de serviços nesse formato, com as peculiaridades previstas na MP 927/2020.

No entanto, no caso de novas pactuações que visem alterar o regime de trabalho do empregado para o teletrabalho, haverá necessidade de aplicar o acordo individual e as regras estabelecidas na CLT, sem as flexibilizações previstas na Medida Provisória.

Saúde e Segurança Ocupacional:

As regras relativas à saúde e segurança ocupacional, também sofreram alterações significativas com a MP 927, como a suspensão da obrigatoriedade dos exames médicos admissionais e periódicos, dispensa do exame demissional em algumas hipóteses, suspensão dos treinamentos e manutenção da CIPA, ainda que encerrados os mandatos e suspensão dos processos eleitorais em curso.

Diante da perda de validade da MP 927 os empregadores devem adotar os procedimentos e os prazos legais estabelecidos na CLT e em normas regulamentadoras, assim como retomar os procedimentos necessários à posse dos empregados eleitos ao novo mandato da CIPA.

FGTS:

A MP 927 concedeu durante sua vigência a suspensão da exigibilidade do recolhimento de fundo de garantia pelos empregadores, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente.

O valor devido nestes meses, poderiam ser recolhidos em até 6 (seis) parcelas mensais e consecutivas, nas datas abaixo:

1ª parcela – 07.07.2020;
2ª parcela – 07.08.2020;
3ª parcela – 04.09.2020;
4ª parcela – 07.10.2020;
5ª parcela – 06.11.2020;
6ª parcela – 07.12.2020.

Não obstante a perda de eficácia da MP 927/2020, entendemos que os parcelamentos efetuados quando da vigência da norma permanecem válidos. Todavia, os empregadores devem voltar a recolher mensalmente o FGTS nas contas vinculadas dos empregados junto à CEF.

 

Foto de Edward Jenner no Pexels

Silvia Rebello MonteiroSilvia Rebello Monteiro é advogada da Thomazinho, Monteiro, Bellangero e Jorge Sociedade de Advogados na área trabalhista. É graduada da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em 2003. Especialista em Direito e Processo do trabalho pela Pontifícia Universidade Católica, em 2013. Membro da OAB / São Paulo, desde 2003.

Paola Abilio MoratoPaola Abilio Morato é advogada da Thomazinho, Monteiro, Bellangero e Jorge Sociedade de Advogados na área trabalhista. É graduada pela Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), Pós Graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil desde 2008.